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Tipos para Entender a Língua Bolsonarista
Ricardo Sturmer
setembro 2019
Bolsonaro
fala para um público segmentado e é neste sentido que devemos
entender suas declarações estapafúrdias. Cada uma delas visa
agradar uma parte de seu público. A sua campanha, apoiada por
Bannon-Cambridge Analítica, foi baseada nesta segmentação. Suas
declarações violentas, que podem ser tomados como ato, levam ao
aumento da violência, como a execução do sequestrador do ônibus
no Rio ( um negociador poderia ter evitado, um tiro bastava para
neutralizar, 5 tiros é execução ) e as mortes por tiro nas
comunidades ( a Glöbbelsgolpe não fala de tiros da polícia ).
O
ponto forte foi a campanha de desinformação que envolvia a
discussão da sexualidade no ambiente escolar. Foi montada a
divulgação de uma black-propaganda que atribuía a esquerda uma
corrupção moral de erotização infantil que levaria à pedofilia.
Os
tipos distinguidos por Isabel Kalil do público segmentado de bozo
nos ajudam a melhor dialogar com estas pessoas e entender o motivo
das besteiras faladas por ele. Abaixo um extrato de sua pesquisa:
1.
As pessoas de bem:
Instituições
fortalecidas para o fim da impunidade
Não
acreditam que a “justiça com as próprias mãos” possa a
ser
a solução para o país, repudiam a violência entre os cidadãos e
desejam que
as
instituições sejam fortalecidas. Este perfil comporta um amplo
espectro de
posições
que variam desde a proposta de que a Polícia Federal deveria
substituir
o
Supremo Tribunal Federal, até aqueles que clamam pela volta da
ditadura
militar
ou uma “intervenção militar temporária e constitucional”.
A
frase “direitos humanos
para
humanos direitos” serve como síntese para expressar que o Estado
só age
de
maneira mais bruta ou viola direitos daqueles que não são “pessoas
de bem”.
2)
Masculinidade viril:
Armas
para os civis fazerem justiça com as próprias mãos
Muito
próximo da “pessoa de bem”, estes perfis compartilham das
mesmas
características com uma exceção: a justiça não seria
“terceirizada” para
as
instituições e sim exercida pelo próprio cidadão.
Este
perfil enxerga a violência urbana como o maior problema
social
e se vê como um sujeito constantemente ameaçado. Alguns homens
deste
perfil
definem a si mesmos como “opressores”. Diante do problema da
violência,
o
“opressor”, vislumbra no porte de armas uma solução, pois
acredita que os
cidadãos
devem ter condições de se defender e também de praticar justiça,
quando
necessário. A justiça neste sentido, é vista como a capacidade de
se
defender
de “bandidos”, mas também de se defender contra eventuais abusos
do
próprio
Estado, leia-se uma ditadura comunista ou um governo autoritário de
esquerda.
3)
Nerds, gamers, hackers e haters
A
construção de um mito
Esse
grupo foi um dos principais responsáveis
por
disseminar a imagem de Bolsonaro em sua pré-campanha, o que
contribuiu
consideravelmente
para sua atual “popularidade”. A figura em particular
construída
pelos nerds, gamers e hackers conservadores compreende a do
‘bolsomito’,
lapidada a partir da produção, majoritariamente nas redes sociais,
de
memes centrados no candidato, geralmente acompanhados por um tom
jocoso
e provocador”.
4)
Militares e ex-militares
Guerra
às drogas como solução para a segurança pública
Repudiam, em sua maioria, a escalada da criminalidade, a
desvalorização e o sucateamento das instituições voltadas para a
segurança pública e também a falta de ordem nas instituições
nacionais e na
sociedade civil.
No tema da criminalidade, este perfil critica a ascensão de facções
criminosas
como PCC (Primeiro Comando da Capital) e CV (Comando Vermelho),
vinculam
esse fenômeno à despreocupação dos governos de esquerda com o
tema da
segurança pública, em especial, o problema do tráfico de drogas.
5)
Femininas e “bolsogatas”:
Mulheres
“empoderadas” para além do “mimimi”
Assim,
algumas dessas mulheres repudiam mais a agenda feminista,
outras
repudiam mais o assédio dos homens e a violência contra a mulher.
Mas
em
todos os casos se alinham com proposições de políticas duras
contra a
“corrupção”,
a criminalidade e também contra a violência de gênero.
6)
Mães de direita:
Por
uma escola sem “ideologia de gênero”
Essas
mães defendem que a “inocência” e a “ingenuidade” infantil
devem ser
preservadas
e temem a “doutrinação da ideologia de gênero” e/ou
“doutrinação
marxista”
nas escolas pelos professores.
7)
Homossexuais conservadores
“Homem
é homem”, não importa se gay ou hétero
A
maioria deste perfil é formada por
homens,
poucas mulheres lésbicas são vistas em meio ao grupo. Este perfil
se
combina
com a “pessoa de bem” na crença de que apenas as pessoas LGBT
que
sofrem
violência são aquelas que “dão pinta” ou “não se dão o
respeito”. Embora
este
grupo não seja numericamente a maior base de apoio a Bolsonaro, seu
perfil
é essencial para ajudar a comprovar a tese de que o candidato não é
homofóbico
e respeita as liberdades individuais.
Este
perfil tende a naturalizar o discurso “anti gay afeminado”, ou
seja, uma pessoa
homossexual
deveria manter a “compostura” perante as pessoas mais velhas e
crianças,
para não oferecer exemplos de “vulgaridade em público”.
8)
Etnias de direita
Minorias
perseguidas por se posicionarem a favor de Bolsonaro
Suas
principais reivindicações são no sentido de buscar
maior
autonomia de posicionamento político, defendendo que minorias
étnicas
têm
sido perseguidas por se posicionarem a favor de Bolsonaro.
A
atuação deste perfil é orientada pela ideia de que os
governos
de esquerda teriam fragmentado uma “unidade nacional” e que
Bolsonaro
teria como proposta um “governo unificador” baseada na ideia de
que
“o
Brasil é um só”, como expressa o jargão propagado pelo próprio
candidato.
Alguns
são contra as cotas, muitos são contra o “vitimismo”. A questão
do
desemprego
é recorrentemente citada. Sua atuação visa diluir as diferenças
entre
as classes, etnias e gênero que, segundo essa tendência, teria sido
propagadas
pelos governos, intelectuais e militantes de esquerda.
9)
Estudantes pela liberdade
Voto
rebelde contra a “doutrinação marxista”
Estes
estudantes não se veem contemplados pelo ambiente escolar ou
acadêmico
e se sentem privados da participação em grêmios e centros
acadêmicos
em razão de posicionamentos políticos.
Dentre
os estudantes de ensino
médio
privado temos aqueles que são contrários às políticas públicas
que
possibilitam
acesso dos jovens de ensino público na universidade e também
qualquer
mecanismo de cota que “facilite” ou “privilegie” certas
camadas sociais
em
detrimento de outras. Para estes, o mérito é o que deve imperar.
Especificamente
em relação aos cursos de
humanidades,
fazem fortes críticas à uma “educação doutrinadora”, que não
respeita
os valores que os alunos trazem de casa, ou, até mesmo, de sua
“formação
política independente”. Vislumbram a “doutrina marxista” como
uma
grande
ameaça à educação imparcial liberal, fazem coro a discursos sobre
o
“marxismo
cultural” e da escola enquanto uma forma de reprodução da
“ideologia
comunista”.
10)
Periféricos de direita
Os
"pobres" que desejam o "Estado mínimo"
O
grupo caracteriza-se pela revolta e pela denúncia da
violência
e da impunidade que são por eles vividas em regiões periféricas da
cidade
e/ou questões específicas como violência contra mulheres e
crianças,
estupro,
problemas econômicos, desemprego, corrupção e ainda sobre a má
qualidade
dos serviços públicos. Segundo esta perspectiva, as posturas e
propostas
“de esquerda” não dão conta de resolver ou não davam a atenção
necessária
para estas questões, com ênfase especial à questão da segurança
pública.
Sobre
uma potencial redução do papel do Estado - já que são pessoas que
dependem
dos serviços públicos -, na percepção de parte dos entrevistados,
a
defesa
do Estado mínimo significa que o Estado deveria intervir o mínimo
possível
em questões consideradas como o campo da religião ou da vida íntima
(leia-se
moral) e não necessariamente implicariam em uma redução de
serviços
públicos,
como a educação e a saúde.
11)
Meritocratas:
O
antipetismo dos liberais que “venceram pelo próprio mérito”
Este
perfil assume um dos discursos mais convictos
principalmente
contra a corrupção, tendo como expressão um acentuado
antipetismo.
Possuem uma visão mais racional e esclarecida a respeito de um
projeto
de Estado neoliberal ou Estado mínimo. Defendem redução ou corte
de
programas
sociais, tendem a ver estes programas ou como privilégios ou como
formas
de tornar as pessoas pouco produtivas.
O
que importa é que Bolsonaro não
representará
o modelo econômico petista que corrobora uma tendência vista
como
negativa na sociedade brasileira que teria “muitos direitos e
poucos
deveres”.
12)
Influenciadores digitais
Liberais
e conservadores “salvando o Brasil de se tornar uma Venezuela”
Os/as
influenciadores/as tem eles/elas mesmos/as perfis heterogêneos: 1)
Convertidos:
pessoas que já foram comunistas, gays, feministas, ateus e
militantes
de esquerda, mas que abandonaram esses movimentos e assumiram
uma
postura de duras críticas em relações a eles. 2) Celebridades:
são, muitas
vezes,
cantores, atletas e artistas que declaram apoio à Jair Bolsonaro,
seus
posicionamentos
geram grande repercussão. 3) Pensadores, intelectuais e
jornalistas
que lançam tendências, realizam análises e, por vezes, possuem
afinidades
ideológicas com a direita internacional (liberal ou conservadora).
13)
Líderes religiosos
A
defesa da família contra o “kit gay” e outros pecados
São
arautos do que é entendido como formas de conduta
adequadas
e íntegras, por conta disso, repudiam a “ideologia de gênero”,
que é
vista
como pecado e degeneração dentro das instituições religiosas.
Possuem
um
discurso extremamente forte em relação ao que chamam “kit gay”,
que
estaria
corrompendo as crianças na escola. Segundo eles, seriam materiais
didáticos
e ações que estariam “ensinando para meninos que ser menino é
errado
e para meninas que ser menina é errado”. São extremamente
críticos ao
feminismo,
especialmente, na questão do aborto. Nesse contexto, seu discurso
deixa
claro que pautas defendidas pelo movimento feminista, movimento LGBTQ
e
projetos de discussão de gênero e sexualidade nas escolas estão
promovendo
a
“destruição da família tradicional”.
14)
Fieis religiosos
Cristãos
pela “família tradicional”
O
que repudiam: Possuem a percepção de que a “família tradicional”
vem sendo
ameaçada
nos últimos tempos e que o PT corroborou para que isso acontecesse,
sobretudo
com aquilo que propunham para a educação das crianças, levando
“ideologia
de gênero” e o “kit gay” para dentro das escolas. Acreditam
que nos
últimos
tempos houve, no Brasil, uma inversão de valores onde há defesa do
criminoso
e não da vítima, o aumento do incentivo ao consumo de drogas, ao
aborto
e a promiscuidade por parte de jovens esquerdistas e feministas.
Estes
grupos
estariam subvertendo a família tradicional em favor de uma possível
“ditadura
gayzista”.
15)
Monarquistas
O
retorno a um passado glorioso
A
figura do “príncipe” é importante na campanha do
candidato
para ajudar a conformar um ideal de “passado glorioso”, que é
evocado
seja pelos tempos imperiais, seja pelo tempo dos militares. Em ambos
os
casos, se busca reforçar a “manutenção da ordem”. Assim, como
a glorificação
dos
tempos da ditadura militar, a figura dos monarquistas ajuda a
construir
imagens
de um passado utópico em relação a um futuro distópico e caótico.
16)
Isentos
“Política
não se discute”
Estão
incluídos nesse grupo pessoas que mantém a opinião de que
“religião,
política
e futebol não se discute”, ao menos em público. Característico
desse
perfil
são as pessoas que defendem que Bolsonaro não representa a solução
para
os problemas do país, mas possuem um forte sentimento antipetista,
anticorrupção
ou antisistema.
Tendem
a ver que a polarização foi iniciada pelo PT,
embora
tanto a direita quanto a esquerda são vistos como agentes da
violência,
reforçando
sua posição apaziguadora de conflitos. Em seu discurso, também
está
presente
uma forte repulsa à corrupção, o que na verdade alimenta seu
antipetismo,
argumentam que a corrupção passou dos limites e que ela é uma
das
maiores responsáveis pela crise econômica do país.
Referências